Rádio Player

‘Amazônia negra: expedição Amapá’ revela a força da ancestralidade afro-amapaense em jornada cultural com Carlinhos Brown

Documentário estreou no Globoplay e mergulha na resistência negra, nos ritmos do marabaixo e nas tradições da Amazônia

O documentário Amazônia Negra: Expedição Amapá estreou nesta sexta-feira (12) no Globoplay propondo uma imersão profunda na cultura afro-amapaense e na resistência histórica da população negra em um dos territórios mais simbólicos da Amazônia brasileira. Com direção de Marcel Lapa e participação especial de Carlinhos Brown, a obra percorre rios, estradas e comunidades do Amapá para revelar manifestações culturais, saberes ancestrais e histórias que atravessam séculos e seguem pulsando no cotidiano do estado.

Realizada em 2025, a produção dedica seus 42 minutos a reconhecer a história da população negra amapaense, valorizando suas danças, cantos, ritos, conhecimentos tradicionais e modos de vida. A narrativa tem como fio condutor o Marabaixo, expressão cultural reconhecida pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) como bem cultural imaterial do Brasil, considerada o principal símbolo da identidade afro-amapaense.

Uma jornada guiada pela ancestralidade

Ao longo do documentário, Carlinhos Brown atua como mediador sensível entre culturas que compartilham a mesma raiz africana. Reconhecido por sua trajetória ligada à valorização da cultura afro-brasileira, o cantor conduz o espectador por Macapá, Oiapoque, Mazagão, pelo quilombo do Curiaú e por bairros que mantêm viva a tradição do Marabaixo e de outras manifestações populares.

Entre rios, ruas e territórios culturais, Brown se conecta às vozes dos marabaixeiros, aos sons dos tambores, às saias rodadas e aos “ladrões” — versos cantados durante os festejos — criando um diálogo entre a cultura baiana e a cultura amapaense. O encontro evidencia uma brasilidade que nasce da ancestralidade africana comum, fortalecida pelo tambor como símbolo de memória, resistência e identidade.

“O documentário mostra um Brasil que começa a se despertar para lidar melhor com seus profundos conhecimentos e compreender o legado ancestral”, afirma Brown. “Ali do lado, atravessou um ponto, se fala francês, uma França vizinha ao Brasil. Lá, as culturas estão preservadas pela força da manutenção das pessoas que ali vivem. Os intercâmbios se dão de forma espontânea, natural e familiar”, completa o artista.

Reconhecimento e encontro simbólico

Um dos momentos marcantes do documentário acontece em Macapá, capital do Amapá, durante um grande evento que reúne a comunidade marabaixeira. Na ocasião, Carlinhos Brown é reconhecido como embaixador do Marabaixo, título concedido pela própria comunidade e oficializado pelo Governo do Estado do Amapá. A cena simboliza não apenas o respeito mútuo entre o artista e os mestres da tradição, mas também a importância do diálogo entre diferentes territórios da cultura afro-brasileira.

O reconhecimento reforça a proposta central do filme: valorizar quem mantém essas tradições vivas e ampliar o alcance de suas histórias para além das fronteiras regionais, levando-as a todo o país por meio do audiovisual.

A força estética e sensorial da cultura amapaense

Produzido pela Join Entretenimento em parceria com a Tha House Company, Amazônia Negra: Expedição Amapá se destaca também pelo cuidado estético. As cores vivas das vestimentas tradicionais ganham protagonismo ao longo da narrativa, contrastando com os verdes intensos da floresta e os tons dos rios amazônicos.

A fotografia valoriza detalhes dos festejos, dos gestos corporais e dos rituais, criando uma experiência sensorial que aproxima o espectador da vivência cultural apresentada. O som dos tambores, os cantos coletivos e as falas carregadas de memória compõem um retrato potente de uma cultura que resiste e se reinventa.

Para o diretor Marcel Lapa, a experiência de filmar no Amapá foi transformadora. “Participar do documentário foi uma experiência única, marcada por sensibilidade e acolhimento. A imersão cultural e musical trouxe uma intensa troca de energia e renovação espiritual diária. Cada etapa foi conduzida com respeito e cordialidade, revelando respostas pessoais profundas”, afirma. “Este projeto ampliou meu olhar sobre a riqueza cultural do nosso país e deixou em mim um sentimento pleno de realização”, completa.

O ritmo que move o Amapá

Em Macapá, cidade cortada pela linha do Equador, passado e presente se encontram de forma simbólica. É nesse território de latitude zero que acontece o tradicional Ciclo do Marabaixo, uma sequência de festejos populares que mobilizam comunidades inteiras. Em cortejos de rua, os marabaixeiros percorrem os “Barracões”, espaços onde acontecem as celebrações e onde a tradição é transmitida entre gerações.

A origem do Marabaixo remonta ao período da escravidão. Seus passos arrastados, presentes na dança, são frequentemente interpretados como uma memória dos pés acorrentados e do sofrimento vivido pelos negros africanos trazidos à força para a Amazônia. No entanto, o documentário mostra como essa dor foi ressignificada ao longo do tempo, transformando-se em expressão de identidade, resistência e celebração da vida.

Oralidade como guardiã da memória

Entre os depoimentos presentes na obra, a dançadeira Samanda Carvalho explica, a partir da oralidade, a origem do nome Marabaixo. Segundo as narrativas históricas transmitidas entre gerações, quando negros morriam nos navios negreiros, seus corpos eram lançados ao mar, “mar abaixo”. A expressão teria dado origem ao termo que hoje nomeia uma das mais importantes manifestações culturais do Amapá.

No documentário, essa história é contada com orgulho e consciência histórica pelos descendentes daqueles que viveram a violência da escravidão. O sofrimento do passado se transforma, no presente, em potência cultural e em base para a produção artística contemporânea, fortalecendo a identidade de um povo que encontrou na cultura um caminho de resistência.

Tradição, consciência e gratidão

Em um dos trechos mais simbólicos do filme, Carlinhos Brown reflete sobre sua relação com a ancestralidade africana e com as tradições que o formaram como artista e como sujeito. “O que eu tenho é a consciência de que vim da África. Eu não vim da escravidão, porque se eu viesse da escravidão, eu não poderia chegar ao que cheguei”, afirma. “E chegar ao que cheguei, digo o tempo inteiro, não é mérito meu, mas é mérito das tradições”, completa.

A fala sintetiza o espírito do documentário, que propõe um olhar para a história negra não a partir da dor como destino final, mas da herança cultural como base para a construção de futuro, autoestima e reconhecimento.

Muito além do Marabaixo

Além do Marabaixo, Amazônia Negra: Expedição Amapá apresenta outras festividades populares e revela uma culinária rica, marcada pela originalidade dos modos de vida de quem habita a floresta e as margens dos rios amazônicos. O documentário mostra como cultura, território e alimentação se entrelaçam, formando um conjunto de saberes que sustentam a identidade local.

Ao final da jornada, Carlinhos Brown promove encontros com artistas da cena musical amapaense, ampliando sua vivência e criando pontes entre diferentes expressões sonoras. Esses diálogos reforçam a ideia de intercâmbio cultural e mostram como a tradição pode dialogar com o contemporâneo sem perder sua essência.

Exibição e alcance nacional

Já disponível para assinantes do Globoplay, Amazônia Negra: Expedição Amapá amplia seu alcance ao chegar também à programação da Globonews. O documentário será exibido no canal no dia 20 de dezembro, às 23h, levando a história, os sons e as cores da cultura afro-amapaense para um público ainda maior.

Ao reunir memória, música, dança, oralidade e paisagem, o filme se consolida como um registro sensível e necessário sobre um Brasil que ainda precisa ser conhecido, reconhecido e valorizado.

Compartilhe agora!